Colunas / Mãe de Mochila

E hoje fez um ano

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Publicado em 11/08/2017, às 13h15 por Rebecca Barreto


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Duas crianças correndo com suas maletas por Guarulhos em busca de um destino incerto Às vezes sinto que elas sabiam o quanto eu precisava do otimismo delas no meu coração amedrontado. Eu, 9 malas, carrinho de bebê, 3 malas de mão, travesseiro e naninhas, dois parceiros de jornada e um buraco negro no estômago.

Dois meses antes, meu marido entrou pelo corredor gélido da Polícia federal do Brasil, e partiu numa despedida abrupta, seca, desaparecendo no corredor do embarque para uma vida incerta e turva. Incerta e turva como todos os inícios e reinícios de vida são.

Aos prantos, vendo-o entrar na Polícia Federal, e sabendo que a distância entre nossa família só aumentaria nos meses seguintes, me esparramei dentro de mim mesma. Foi um buraco na alma.

Mas, na noite da nossa partida, tudo era diferente. Meus filhos simbolizavam aquele cafona e já manjado Sol Nascente que representa o recomeço de cada dia. Sol Nascente que simboliza também a Ásia, onde o futuro chega primeiro. Ali embarcaríamos para o futuro, e, de novo, para o incerto. Aquele incerto que insistimos em achar que podemos planejar.

Antes, minha filha, durante um banho coletivo para encobrir nossa solidão disse, “mas mãe, o papai vai trabalhar pra sempre lá longe? sim, filha, e vamos nos ver aos poucos quando der. – mas mãe, somos família, e família tem que ficar junto”. Estava claro. Eles estavam prontos. E com isso, comecei meu grande família vende tudo. Reduzir nossa vida para 7 caixas de brinquedos deles e meus vinis. Reduzir não, rejuvenescer.

Depois de 30 horas de vôo, embriagados com os tantas burkas e porsches no Duty Free, filmes no ipad em repeat, muitas de doses de redoxon e stilnox mascaradas por chicletes, desembarcamos para aquela que seria a maior aventura de nossas vidas. Eu que me achava vivida, precoce e guerreira, com minha carcaça-armadura pronta pra batalha. Nunca uma mala esteve tão cheia de repelentes, homeopatia e filtros solares.

Chegamos. O bafo galopante de um calor de 36 graus com umidade 60% nos invadiu e foi como se entrasse dentro de nós. O suor escorria por todos os poros em lugares que eu nem sabia que poderia suar, parecia um paradoxo para o frio que eu sentia na barriga. O reencontro com o pai pareceu mais programa dominical da record. Daqueles bem populares e até piegas. Emocionou quem estava ao redor. Crianças e pai rolando pelo chão e um mar de mala nos rodeando. Foram só dois meses separados, mas como dizem, crianças são esponjas e também sacaram toda emoção que sentíamos.

Não foi fácil ver meus filhos aos prantos quando suas séries preferidas do Netflix não tinham mais áudio em português. Foram muitas noites que todos nos encontrávamos as 3 ou 4 da manhã na sala para um snack. Nada, a partir dali, mais seguiu o rumo planejado. Já imaginou chamar uma helper dita experiente com brasileirinhos para ajudar com as crianças e perceber que ela fazia macarrão com açúcar “pois é assim que essas crianças brasilerias gostam”?

A Ásia me ensinou a me ouvir mais. A ouvir meus filhos. A ouvir meu marido e a dialogar, buscando o ponto onde nossos sonhos se encontram. O mundo ficou pequeno. A Ásia nos ensinou o mais amplo sentido da palavra respeito. Eu que achava que morar no Brasil ou ter morado nos EUA tinha me ensinado algo sobre Coexistência, mal sabia o quanto um país micro, que segue 4 calendários, incentiva verdadeiramente várias religiões, um país com uma miríade de aromas e muitos sotaques, ampliaria minha compreensão de “melting pot” do mundo.

Certo dia, depois de quase dois meses aqui, minha filha de 8 anos me perguntou ao entrar no Uber “mãe, este motorista é muçulmano ou indiano? Ah, é muçulmano, pois o chapeuzinho dele é mais quadrado que os chapéus indianos”.  Nesse momento eu explodi por dentro e vi, que de alguma forma, eu estava fazendo algo certo para o futuro deles. Num mundo de Trumps, ISIS, Bolsonaros, vi que eu podia recuperar a fé na humanidade, a partir da minha fé nos meus filhos pequenos.

A vida de estrangeira me ensinou a acreditar que toda regra do mundo civilizado tem uma razão de existir, que o jeitinho brasileiro não serve de nada, e que liberdade mesmo, está mais dentro, do que fora de nós. Liberdade que é traçada diariamente sobre as escolhas que fazemos e não no que nos é ofertado. Aqui nada vem de mão beijada, influência de Confúcio.

E hoje, daqui do futuro, vejo filhos com coração aberto, se interessando em girar o globo e parar o dedo aleatoriamente num local qualquer para ver se já conheceram alguém de lá. Vejo filhos mais tranquilos em correr riscos. Riscos calculados e os riscos surpresas. Riscos felizes e desejados. Aprender a ter gosto por se jogar no escuro. O que mais podemos nutrir em nós mesmos, para toda a vida, do que a curiosidade para o que não sabemos?

E do alto desse ano Matrix, onde nosso comprimido azul nos trouxe para este mundo que oscila entre Tokyo, Miami e Manaus, só desejo que estas malinhas curiosas, rodopiantes e carregadas de milhagens e memórias, acompanhem meus filhos para todos os mundos que ainda estão por vir.

E, como diz a Marisa Monte, “Eu só quero que você siga, Para onde quiser, Que eu não vou ficar muito atrás”.


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