Família

Pai perde a esposa para o câncer e escreve cartas aos filhos que valem como uma lição de vida

Rafael Stein/Arquivo pessoal
Rafael Stein/Arquivo pessoal

Publicado em 10/01/2019, às 16h52 - Atualizado em 06/06/2019, às 12h01 por Jennifer Detlinger, Editora de digital | Filha de Lucila e Paulo


“Não podemos mudar a realidade, temos que resolver como reagir. Não podemos trocar as cartas do jogo, mas podemos mudar a forma como jogar”. É dessa forma que Rafael Stein, pai de Maria Clara e Francisco, define o seu processo de superação e aceitação, ao lado da família, nos últimos 2 anos. 

Micaela, sua esposa e mãe dos seus filhos, recebeu o diagnóstico de um câncer de mama triplo-negativo de forma inesperada e repentina. “Receber a notícia do diagnóstico do câncer não abala só quem porta a doença, mas também amigos e familiares”, relata Rafael. Após meses de tratamento, Micaela faleceu, em setembro de 2018, mas deixou aos filhos e ao marido ensinamentos e valores que vão além da parte física.

(Foto: Rafael Stein/Arquivo pessoal)“Ao mesmo tempo que o tumor foi agressivo desde o início, a Micaela foi valente o tempo todo e minha única alternativa era estar ao lado dela. Eu devo a ela e aos meus filhos a parte mais legal da minha personalidade. Aprendi com ela sobre respeitar, amar, ser gentil com as pessoas, entender que estamos aqui por pouco tempo, aproveitar melhor o dia, valorizar aonde você está”, relata Rafael, que escreve textos e cartas aos filhos no site Cartas para Maria

Confira a seguir o depoimento dele, sobre suas experiências, incertezas, dificuldades, aprendizados, amores e felicidades que viveu ao longo desses dois anos:

“Meu nome é Rafael, sou pai da Maria Clara, de 6 anos, e do Francisco, 2 anos, e fui casado com a mulher dos meus sonhos. Aprendi que, se houver um elefante na sala, trate de apresentá-lo. Então, se houver alguém lendo que não sabe o que está me acontecendo, eu gostaria de apresentar  o “Câncer de mama triplo-negativo”.

Nosso segundo filho, Francisco, completaria 10 meses naquele mês. Era dezembro, o Natal se aproximava, ainda estávamos nos adaptando à rotina do segundo filho e planejando como seria o Natal e o Ano Novo com as crianças. Em algum momento durante a amamentação ou no banho, Micaela sentiu um nódulo ou um caroço no seio esquerdo. Como ela estava amamentando, em um primeiro momento confundimos com algo relacionado à amamentação. Não imaginávamos que seria grave e, até por isso, adiamos a ida ao médico até  que o nódulo ficou aparente, bem visível e começou a doer.

(Foto: Rafael Stein/Arquivo pessoal)

Como estávamos entre o Natal e Ano Novo, não conseguimos consulta com a ginecologista e fomos orientados a ir ao hospital. Micaela fez um ultrassom que não foi conclusivo e, por ainda estar amamentando, não foi possível ter o diagnóstico. Saímos com mais dúvidas e com a orientação de procurar um especialista.

Conseguimos marcar uma consulta logo depois do Ano Novo. A médica que nos atendeu deu início ao exame e, após alguns minutos, ficou com o semblante mais sério. Ficamos em silêncio e ela disse que chamaria uma outra médica para visualizar e ajudar no diagnóstico. Conhecemos a Dra. Sandra, que deu continuidade ao exame e, após alguns minutos descreveu o que havia encontrado e indicou a biópsia.

Me recordo da Micaela perguntar qual era a chance do exame vir negativo e a Dra. Sandra responder: só por um milagre. Aí a Micaela desabou e entrou em desespero. Eu ainda fiquei sem entender o que estava acontecendo. Eu trocaria de lugar com ela. Tive que me manter firme ali, minha esposa estava inconsolável.

Entre esse exame e a biópsia tivemos que aguardar, pois ela precisava passar pela ginecologista. O pedido do exame não poderia ser feito pela Dra. Sandra que acabara de nos atender. Eu não me recordo de termos feito uma consulta na ginecologista ou somente ter pego o pedido do exame.

No dia da biópsia teríamos um complicador, pois a Micaela sempre teve fobia de agulha. Além da ansiedade natural e expectativa pelo exames, tínhamos mais esse problema. E para fazer o exame tivemos que sedá-la. Eu fiquei ao lado dela. Eu me lembro do barulho que fazia o aparelho da biópsia.

Naquele momento já estávamos cientes que havia algo e também perdidos, sem saber qual seria o próximo passo, qual o médico que deveríamos procurar. Tínhamos muitas dúvidas e pedimos ajuda à Dra. Sandra para nos indicar um médico. Ela saiu e voltou com o nome de dois médicos e um deles era o Dr. César Cabello. Ela havia, inclusive, marcado a consulta para a sexta-feira seguinte.

Fomos para a consulta na sexta-feira. Me recordo de ficarmos aguardando na recepção e, sem muito o que dizer, ficamos de mãos dadas. Não me recordo de detalhes. Fomos chamados e logo que entramos começamos a conversar e o Dr. César estava com a pasta do resultado na mesa. Falávamos de qualquer coisa e, em um determinado momento, a Micaela perguntou sobre o resultado, se tinha saído algo. Ele então respondeu: “Nós temos um tumor. Temos um tumor sim”. A Micaela desabou. Me lembro exatamente dela abaixar a cabeça na mesa e chorar. Depois de se acalmar, ela levantou a cabeça e, no momento que escrevo, acredito que foi ali que ela decidiu encarar de frente. Ela levantou e perguntou qual seria o próximo passo.

Eu fiquei o tempo todo tentando racionalizar, imaginando o que teria que fazer. E ao achar que tinha o controle perguntei quanto tempo teríamos. Eu não consegui terminar a frase. Chorei. Eu chorei na frente dela. Eu queria parar, não queria que ela me visse chorando. Queria estar forte ao lado dela para ajudá-la, mas não aguentei. Aí ela me consolou e falou que ia dar tudo certo. Conversamos sobre os próximos passos. Dr. César nos indicou a Dra. Suzana, que seria a oncologista da Micaela e que depois nos indicou a Adriana, enfermeira que cuidou da Micaela. Terminada a consulta, nossa preocupação passou a ser as crianças e queríamos ir para casa para ver e falar com nossos filhos.

Maria Clara e Francisco

(Foto: Rafael Stein/Arquivo pessoal)

A primeira coisa que fizemos ao chegar em casa foi contar para a Maria Clara. A Micaela chegou, abaixou e falou olhando nos olhos da Maria Clara que a mamãe estava doente, que a mamãe precisaria se ausentar para tomar um remédio para matar os bichinhos que estavam dentro da mamãe. E a Maria riu quando a Micaela contou que iria ficar careca. Acho que só não desabamos por causa deles. O Francisco é muito pequeno, não entende, é provável que nem se lembre da mãe, mas, e a Maria? Foi inevitável pensar como eu iria criar os dois sozinhos. Entrei em desespero. Não sabia o que fazer. Não sabia como ajudar a minha esposa. Fiquei imaginando o futuro. E aí respiramos e voltamos à realidade, seguindo um dia de cada vez.

Tentamos manter a rotina deles e alterá-la o mínimo possível e acho que conseguimos, em parte. Por mais difícil que seja imaginar, mas não foi triste. As crianças participaram de tudo na medida do possível e me recordo da festa que foi cortar o cabelo da mamãe. Embora o quadro que se apresentava fosse muito grave, me recusei a aceitar o que o destino nos reservara. Iríamos passar por isso juntos e raspei o cabelo (grande coisa…). Queria que ela soubesse que eu estaria com ela em todos os momentos. Fui em todas as consultas, quimioterapias, exames de sangue e outros tantos exames.

Buscamos todos os tratamentos possíveis e que estavam ao nosso alcance. Se escolhemos passar por isso em algum momento então tudo bem, mas não iríamos esperar sentados. Lutamos em pé o tempo todo. Ao mesmo tempo que o tumor foi agressivo desde o início, a Micaela foi valente o tempo todo e minha única alternativa era estar ao lado dela.

(Foto: Rafael Stein/Arquivo pessoal)

Não subestime o poder da vulnerabilidade

Quando admitimos que precisamos de ajuda e nos mostramos vulneráveis, há uma oportunidade imensa de criarmos uma conexão muito crua, poderosa, sem os subterfúgios e armadilhas de tentarmos parecer maiores ou mais fortes do que realmente somos. Ao pedir ajuda, criamos também a oportunidade para que o outro exerça a generosidade e talvez desperte algo que ele sequer imaginasse que existia dentro dele. Se tudo der certo, duas pessoas saem felizes da situação. Você, que conseguiu companhia, criou um vínculo e teve ajuda prática com alguma questão e a outra pessoa, que pôde ajudar.

Durante o tratamento da Micaela nos deparamos com diversas situações para as quais não estávamos preparados ou não havíamos nos planejado, desde situações complexas com relação direta com o tratamento até as tarefas do dia a dia, como buscar a Maria Clara na na escola. Muitas destas atividades sempre foram da Micaela, mas ela não podia realizar com frequência. Tivemos que tomar decisões difíceis (principalmente a Micaela) e invariavelmente precisávamos abrir mão de alguma coisa.

Em muitas destas situações nos vimos vulneráveis e impotentes sem saber por onde começar. Mas, desde o início do tratamento, recebemos muita ajuda que chegaram das mais diversas formas. Foram tantas demonstrações de carinho e amor que fica difícil enumerarmos todas aqui, porém cada uma fez a diferença em nossa vida! Então, não seja como eu. Experimente pedir ajuda! E, principalmente não deixe de ajudar, nunca!!!

(Foto: Rafael Stein/Arquivo pessoal)

Ela sempre via as coisas de um jeito que a maioria não se permite ver.

Eu devo a ela e aos meus filhos a parte mais legal da minha personalidade hoje, aprendi com ela sobre respeitar as pessoas, amar as pessoas, ser gentil com as pessoas, entender que estamos aqui por pouco tempo, aproveitar melhor o dia, valorizar aonde você está.

Aprendi e tenho aprendido muito por ter compartilhado minha vida com a Micaela. De cara, preciso dizer que saber da morte de alguém não faz necessariamente com que nos tornemos parte da história dessa pessoa. Nem mesmo assistir à morte de alguém é suficiente para nos incluir no processo. Cada um de nós está presente na própria vida e na vida de quem amamos. Presente não apenas fisicamente, mas presente com nosso tempo, nosso movimento. Só nessa presença é que a morte não é o fim.

Passar por uma perda pode nos dar a percepção do tamanho do amor que fomos capazes de sentir por alguém, de como essa pessoas pode ter sido generosa ao esperar nosso tempo de aceitar a morte dela. A partida da Micaela não levou com ela a história de vida que compartilhamos. Quando a morte acontece, ela só diz respeito ao corpo físico. A Micaela continua sendo minha esposa e mãe dos meus filhos. Tudo que me ensinou, tudo o que me disse, tudo o que vivemos juntos continua vivo em mim.

Eu também quero ver a vida de um jeito diferente, de outra forma, seguir outro caminho, pois a vida é breve e precisa de valor, sentido e significado. E a morte é o melhor motivo para buscar um novo olhar para a vida”.

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