Publicado em 30/07/2018, às 14h36 por Rebecca Barreto
A porta se abriu, meu filho entrou sem saber o que acontecia e ela ficou no hall do elevador. Fechando carrinho, fechando guarda-chuva, e quando foi entrar tomou o maior susto da vida dela. Três amigas helpers e uma vizinha amiga, junto com meus filhos, pularam de dentro do nosso armário e gritamos todos “Happy Birthday, Argene”.
Seus olhos se encheram de lágrimas. Ela cobriu a boca e os olhos para esconder o riso nervoso que se alternava com um choro emotivo, e só fui entender a intensidade de sua reação, depois que ela me explicou que há oito anos não sabia o que era aniversário, e que nunca na sua vida alguém lhe preparou uma festa surpresa antes.
Elas são braços e pernas por aqui. Carregam os filhos brancos, loiros, chineses, indianos no colo, nos ombros ou puxando pelos braços. Embaixo de sol, debaixo de chuva, ou segurando os pequenos mais rebeldes para atravessar o sinal das ruas. Elas são as filipinas. E formam a maior etnia dentre as trabalhadoras domésticas em Singapura. Como Argene, são todas jovens, que deixam seus filhos em seu país, e que usam os aproximadamente quinhentos dólares que ganham de salário aqui para pagar a sobrevivência e os estudos da família em Filipinas e – se der sorte – quem sabe, comprar um lote de terra para cultivo de arroz ou banana. E pensando que, até pouco tempo atrás, somente dois países do mundo não permitiam o divórcio – Vaticano e Filipinas-, dá para se imaginar o quanto as helpers filipinas bancam até seus ex maridos e suas novas famílias.
Aqui também vemos as helpers da indonésia, que mesmo sendo muçulmanas, muitas vezes trabalham em casas que comem porco todos os dias ou têm que cuidar de cachorros, o que é proibido pela sua religião e negligenciado pelos seus empregadores. Temos também uma parcela de helpers de Myanmar que, sem nenhuma noção de inglês e com zero experiência, topam qualquer tipo de emprego, salário, família ou carga horária e acabam invariavelmente sendo exploradas por empregadores abusivos.
Singapura, assim como Hong Kong, Bangkok ou Dubai, com altos índices de expatriados, possui acordos de parcerias com os governos das Filipinas, Indonesia, MyanMar, Sri Lanka, India e até Camboja, de forma a garantir que as famílias expatriadas – cujos chefes ocupam cargos de chefia em empresas locais – possam contratar ajuda doméstica.
Aqui não há emprego ilegal, informal, e nem gente disposta a ocupar este filão de emprego doméstico. Dessa forma, quem quiser contratar uma helper estrangeira deve fazer um curso online de empregador,pagar seguro saúde, e fazer um seguro para cobrir as despesas legais, – como a multa de até vinte mil dólares – caso a helper fuja ou cometa algum crime. Desta forma o governo não se responsabiliza pela saúde nem pela assistência básica para essa população flutuante de empregados domésticos. Bem conveniente. Bem conveniente. Você, empregador, passa a ser inteiramente responsável pela sua helper, inclusive no âmbito civil. E notem que as helpers não têm direito de pedir demissão. Quebrar um contrato de dois anos, sem férias, exige concordância dos patrões. E quando se termina o contrato, o empregador deve despachar a helper para seu país de origem. Isso é a lei. Se você quiser fazer ou dar mais, é sua opção. Férias anuais, sua opção. Determinar jornada e horas de trabalho, sua opção. Dividir sua comida com ela, ou fazê-la comprar a própria comida, sua opção.
Então, Os brasileiros, com um passado escravocrata, lidam com essa realidade com um pé nas costas. Já os europeus, ingleses ou australianos, vindo de países com altíssimos impostos e grande estrutura para crianças, pouco sabem sobre o que é ter uma pessoa, morando em nossa casa, lavando nossos pratos e nossas calcinhas. São os que estão todo tempo se sentido culpados em tê-las por perto. Com um sentimento de culpa pouco disfarçado, acabam muitas vezes, complicando a situação deles e das helpers. As famílias chinesas mais antiquadas têm fama de abusarem das moças. Provavelmente é esse o caso de Argene, embora ela nunca tenha me contado nada.
Argene, que quando começou comigo, não sabia o que era uma torradeira, ou não sabia a maior parte dos nomes das frutas, e na nossa primeira conversa pediu para eu determinar o horário de retorno dela para casa aos domingos (curfew) – sim, aqui elas trabalham nonstop, saem no domingo de manha para voltar ao fim da tarde. Dormir fora do local de trabalho pode render expulsão do país. E quando ela veio conversar, eu sem conhece-la ainda, sem saber que horas responder, falei: “pode ser o mesmo da sua outra família, ok?”, Insegura, ela perguntou se podia ser um pouco mais tarde, pois ela, em 7 anos aqui em Singapura (e sem férias), nunca tinha visto as luzes dos arranha-céus do centro da cidade a noite, a orla do rio iluminada, muito menos jantado fora.
1. Engoli o meu choro, respirei, e fingi que era super normal aquilo tudo que ela me contava, e disse, “9pm is good for you?” e ela chorou de emoção agradecendo muito. E nunca chegou às 9:10.
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