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A difícil missão de ser preta e mãe pela segunda vez

É preciso falar sobre esse assunto - Arquivo Pessoal
Arquivo Pessoal

Publicado em 04/12/2020, às 08h51 - Atualizado em 19/04/2021, às 08h12 por Toda Família Preta Importa


**Texto por Eva Lima, mãe de Nícolas e Davi, médica veterinária por formação, empreendedora e influenciadora digital; com a colaboração  de Gilvanete Costa, jornalista, filha de Djanira e José

É preciso falar sobre esse assunto (Foto: Arquivo Pessoal)

Quando recebemos a notícia da chegada do segundo filho, a sensação é de que o amor que já era tão imensurável será agora multiplicado. Por outro lado, junto a  essa explosão de sentimentos vem também o medo, inseguranças, e as dúvidas pairam sobre a nossa mente, invadem o nosso ser. As mães, de modo geral, se deparam com vários questionamentos sobre si mesmas: “Será que eu vou dar conta?”, “Será que o mais velho vai ter ciúmes?”, “Mudo o tema do quarto ou deixo como está?”.

Ser  mãe de duas crianças negras, para além de todas as questões anteriormente citadas, envolve  uma série de problemáticas a serem enfrentadas como, por exemplo, o racismo que é uma constância no nosso dia a dia. Somos contestadas até mesmo sobre o tempo certo pra ter nosso  primeiro filho, quem dirá se devemos ter o segundo… Eu mesma já fui questionada se não tinha TV em casa, quando tive meu  primeiro filho.

Vale destacar que, quando engravidei pela primeira vez, aos 21 anos de idade, eu já tinha de certa forma minha independência financeira, empreendia no ramo de decoração de festas infantis e estava concluindo minha graduação em medicina veterinária. Contudo, reunir todas essas habilidades não era suficiente aos olhos de uma sociedade conservadora, racista, que faz julgamento de valor sem conhecimento de causa. É cansativo e desgastante ter que justificar a nossa própria  vida, nossas ações para terceiros, pessoas que não somam, apenas somem.

Empatia X situações constrangedoras

Empatia é  uma palavra que está  sendo bastante difundida, sobretudo, na internet, em coletivos das mais variadas vertentes, porém, é algo que pouco contempla as mulheres negras, principalmente quando estas se tornam mães. A sensação que eu tenho, é a de que mulheres negras e o povo preto no geral, não gera comoção social, a comoção é seletiva.

As situações de constrangimento as quais somos submetidas são frequentes, normalmente as abordagens são invasivas e desrespeitosas. As pessoas não têm nenhum cuidado ao nos interpelar com perguntas pessoais que vão desde: “São filhos do mesmo pai?” até perguntas carregadas de racismo: “Por que esse é mais clarinho?”. Eu me pergunto: será mesmo que isso é o mais importante a ser dito ou perguntado a  uma mãe? Não, não é! Devemos sempre repudiar episódios e falas como estas, nunca naturalizar atitudes grosseiras. Precisamos de uma rede de apoio sólida, não de julgamentos.

São enormes os desafios na parentalidade (Foto: Arquivo Pessoal)

Durante minha jornada do maternar, cheguei a conclusão de que a sociedade não está verdadeiramente preocupada se vamos ou não conseguir promover uma educação de qualidade aos nossos meninos e meninas pretos, saúde, proteção  dos nossos pequenos, o bem viver e sobrevivência dos mesmos na fase adulta. Sinto que há um pacto cujo intuito é apenas tentar, de todas as formas possíveis, desumanizar o nosso maternar, causar desequilíbrio emocional, provocar uma espécie de caos interno.

Desafios de educar crianças  pretas

Entre pensamentos e planos sobre o futuro, os sentimentos de alegria e satisfação de poder criar filhos saudáveis, em segurança, sempre surgem pensamentos intrusos – “será que meu filho vai ser confundido com ladrão?”, “será que ele vai sair hoje a noite e vai voltar vivo?”, “será que um dia eu vou poder dormir tranquila?”. Todas estas inquietações aqui expostas, são preocupações diárias de uma mãe de filhos pretos.

Tudo que eu, mãe de duas crianças negras deseja, é que no futuro pais e mães pretos tenham apenas preocupações comuns, que se livrem do peso de ser duplamente cobrados, que o Estado garanta segurança e o direito de ir e vir dos nossos. Enquanto a sociedade dos sonhos não acontece, continuamos com a dúvida da sobrevivência, sobretudo quando eles crescem e começam  a descobrir o mundo, passam a fazer atividades que é natural dos adolescentes, e eu só penso em todas as violências raciais e opressões que meus filhos poderão sofrer no futuro não tão distante.

A maternidade por si só já traz uma carga de responsabilidade grandiosa a todas as mães. Mas, nós, mães e pais negros temos algumas singularidades que afetam apenas a população preta, estou falando, especificamente, de algo mais profundo, de questões socioculturais dentro de todo esse contexto de exclusões motivadas pela cor da pele. Ou seja, além da sobrecarga física e mental naturais que a maternidade traz, temos também que carregar o fardo do enfrentamento ao racismo que perpassa gerações. Com todas as questões colocadas aqui, eu penso: como viverei tranquila sendo mãe de dois meninos pretos sabendo que, a cada 23 minutos um jovem negro é assassinado no país? Os dados a cada ano que finda, aumentam exponencialmente. E isso desencadeia uma sucessão de problemas emocionais em nós que queremos apenas viver a maternidade em toda sua plenitude, com a garantia de que todos os direitos dos nossos pretinhos e pretinhas serão respeitados, preservados, afinal, somos parte pensante e corpo atuante desta sociedade.

Quero finalizar esse texto afirmando que, a labuta é grande, desafiadora, viver a maternidade real está longe de ser com os comerciais que vemos na TV, nem tudo é fácil, mágico e um mar de rosas, mas eu amo ser mãe, sou grata por ter sido abençoada duas vezes. Me considero uma pessoa privilegiada por ter sido escolhida para ser a mãe de Nícolas e Davi. É como sempre dizemos aqui em casa, nosso amor vai até o infinito e além!


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