Família

Elisa Lucinda fala sobre criação e filho: “Minha poesia deve muito à minha maternidade”

A criação antirracista desde a infância, segundo Elisa, moldou quem ela é hoje - Arquivo Pessoal
Arquivo Pessoal

Publicado em 07/12/2022, às 11h29 - Atualizado às 14h50 por Yulia Serra, Editora | Filha de Suzimar e Leopoldo


Poeta, atriz, intérprete, jornalista e professora. Essas são algumas das multifaces de Elisa Lucinda, mãe de Juliano. Em conversa exclusiva com a Pais&Filhos, ela relembrou a importância da criação rica em cultura e empoderamento para ser a pessoa que é hoje, além de reforçar a necessidade de enxergarmos todos dentro da sociedade. Artista e decidida desde muito nova, Elisa destaca a necessidade de criarmos crianças para o presente e futuro, sem estereótipos.

Como foi a sua infância?

ELISA LUCINDA: Foi uma infância muito frutífera. Com muita alegria, contação de história… A coisa chata que tinha é que minha avó gostava de bater e morava com a gente. Mas eu não me lembro de outra angústia. Era muito legal, um quintal com cachorro, gato, pato, peru, porco, cana de açúcar, pomar, abacateiro, goiabeira. Isso foi muito importante pra mim, porque minha poesia nasceu aí.

De que forma essa criação afetou sua poesia?

EL: Essa infância sensorial, o cheiro da horta, “vai lá, pegar temperos… Essa não é salsa.”. Não era uma fazenda, era uma casa de subúrbio. Dali brotou a minha poesia, porque minha poesia até hoje tem cheiros, cores, chuva, lama, brilho, sol, luar, crepúsculo. Por causa do que eu vi desse quintal.

E como eram seus pais?

EL: Eu sou filha de pais esclarecidos. Isso é a coisa mais importante para dizer, porque quando os pais são esclarecidos, e eu digo isso no sentido de quem tem iluminações no seu pensar, isso define a educação desses filhos. O que eu chamo de iluminação é que eles foram se atualizando, meu pai foi se modernizando, ele é filho também de machismo tóxico, mas ele era um cara sensível, que pegava a gente no colo, brincava, contava histórias, que era um cara inventivo. E minha mãe foi a mãe de yoga no Espírito Santo e chegou a um lugar muito alto para aquele feminismo da época. Meus pais decidiram que nós, uma família preta, íamos ter como passaporte a cultura e que iam criar filhos que não iam ficar escravizados dentro da sociedade, e ao mesmo tempo, criaram a gente também para não fazer escravização com ninguém.

Ser mãe sempre fez parte dos seus planos? Como foi a chegada do seu filho?

EL: Eu sempre quis ser mãe, como toda menina que brincava de boneca. Eu achava que ia ter vários filhos. Mas acabou que não rolou. Só fiquei grávida uma vez e dessa gravidez nasceu esse menino e foi muito interessante a decisão de tê-lo. Eu tinha 23 anos, tinha casado em janeiro, era maio e eu e o pai do meu filho, Zanandré, fomos viajar para o interior do Espírito Santo, município de Pancas, um lugar chamado Vila Verde. Os pais dele eram de lá e a gente foi passar uns 15 dias. No caminho, eu descobri que tinha esquecido anticoncepcional. Aí ele falou: “Olha, que ótimo! Assim se a gente fizer o nosso filho agora, ele nasce aquariano, igual a nós dois”. Eu fiquei super empolgada com a ideia e fizemos o Juliano.

Elisa Lucinda infância
A criação antirracista desde a infância, segundo Elisa, moldou quem ela é hoje (Foto: Arquivo Pessoal)

Como é a sua relação com o Zanandré?

EL: Hoje, temos um grupo no WhatsApp com o maior prazer chamado “Aquário, o Trio”. Eu e o pai do meu filho somos separados desde que ele tinha um anoe meio e nunca deixamos de ser uma família. Nesse momento, o pai dele está na nossa casa em Itaúnas. É o meu grande amigo e parceiro. Nós éramos grandes amigos. A gente viveu um amor maravilhoso, cheio de cartas e declarações. E quando acabou o casamento daqueles dois jovens, voltamos a ser os amigos que éramos.

Como a maternidade afetou seu trabalho?

EL: A primeira coisa que eu fiz foi ajeitar aquele estrondo filosófico, existencial, biológico, que é a gravidez. É uma piração, uma mudança de paradigma. Você fica alterado hormonalmente. Uma sensibilidade louca e isso fez uma mudança epistemológica na minha poesia. Tudo o que eu conhecia de amor se reconfigurou. Tudo o que eu pensava que era amor, era mais… Então, isso mudou a cara da minha poesia, a ciranda do meu existencialismo. Minha poesia deve muito à minha maternidade.

E como foi conciliar esses mundos?

EL: Estudar, trabalhar, ter filho e casar foi a equação mais difícil que a minha geração recebeu e eu dei conta. Fazia a moderna, briguei em casa, discuti com minha família, ainda ia de bicicleta dar aula. Mesmo depois de formada em jornalismo e trabalhando na TV Gazeta, resolvi recomeçar, migrar para o Rio de Janeiro e apontar meus navios para a vida de artista. Eu tinha um emprego estável e almejado. Então essa manobra foi de alto risco e significou deixar meu filho com o pai, coisa que o Brasil não estava acostumado.

Hoje, como pessoa pública, você usa a visibilidade para tratar de assuntos necessários, como racismo e machismo. Como enxerga isso?

EL: Eu alcancei essa visibilidade depois de lutar a vida inteira contra esses dois monstros que sempre estiveram no meu caminho, na vida pessoal, na vida profissional, na vida social. Às vezes, eu olho para mim e para muitos negros e negras que eu conheço e penso que nós todos somos sobreviventes, porque é tanta porrada desses dois lugares sistematicamente. E tem porrada silenciosa e isso vai machucando muito. E já que estou aqui, eu tenho a obrigação de usar essa visibilidade pra fortalecer mais os outros. É uma ciranda que faz parte do meu fundamento de quilombola.

Qual a importância da educação antirracista desde cedo? Você foi criada assim?

EL: Meu pai, o tempo inteiro, identificava o racismo e fazia um certo humor com aquilo. Por exemplo, ele tinha um alto cargo de mérito dele, na Vale do Rio Doce, e ele tinha sempre carro novo e era sempre parado pela polícia. E, às vezes, com a gente dentro, então ele brincava: “Acabei de roubar, para de pressionar onde eu botei meu documento”. Ele dizia: “Quando a gente sabe o final, a gente pode mexer no meio”. O final é de que ele ia mostrar a carteira dele, que iam ver que ele não era um bandido. Meu pai sempre fazia cena. O seu ativismo era provocando cena e eu sou herdeira legítima disso.

Elisa Lucinda de perfil
Elisa Lucinda falou sobre a criação que recebeu e também como criou o filho (Foto: Jonathan Estrella)

E na criação do seu filho? Você abordou essa educação antirracista ou machista?

EL: É fundamento de minha casa essas bandeiras. Quando estava grávida dele, eu queria um menino e dizia: “Eu quero criar um homem que possa amar a nova mulher, que saiba amar essa nova mulher”. Então eu acho que essas bandeiras de racismo e machismo estiveram encruadas, amalgamadas na educação do nosso filho de propósito. Eu deixei meu filho com o pai durante quase três anos para me estabilizar no Rio de Janeiro e quando chegou a hora de eu trazê-lo, o pai dele decidiu vir junto para estar perto do filho, e quando o Juliano fez 16 anos, ele voltou para Vitória, porque sempre preferiu cidade pequena. Eu achei aquilo tão lindo. Foi por amor que ele passou esses anos todos aqui. Eu também queria que meu filho visse uma mulher indo lutar pelo seu sonho. Eu posso ser mãe e posso ser atriz. Acho que essa lição eu consegui dar. A educação do meu filho foi feita com poesia, filosofia humanista da poesia, feminismo, antimachismo e antirracismo.

Você é uma mulher empoderada, que defende causas e fala o que pensa. Sempre foi assim?

EL: Sempre! Eu sempre fui uma mulher inquieta do ponto de vista intelectual e do ponto de vista da evolução cotidiana. Eu lembro de coisas bobas que eu falava quando tinha 20 anos: “Ah, não começa a jogar bola agora, porque eu vou fazer cocô rapidinho” e todo mundo ria… Eu achava tão bobo, todo mundo faz cocô. E hoje, aos 64 anos, continuo achando a mesma coisa. Eu acho um atraso da humanidade tratar assim, com tanta vergonha sua condição.

Você sofreu preconceitos por isso?

EL: Claro, muitas vezes eu fui mal interpretada, porque sou muito brincalhona. Sempre gostei de ter amigo homem. Sempre gostei de roupa transparente, shorts, saia, de botar a perna para fora. Eu gostava de ser aquela mulher e não ser acessível quanto os homens achavam que eu poderia ser. Eu afirmava essa mulher. Era um jeito não previsível e informal de ser, mas era a minha personalidade.

A sua profissão já impactou no seu maternar?

EL: Eu sou aprendiz da minha profissão há muito tempo. Toda vez que estou diante de um personagem novo, tenho uma parte veterana, mas tem uma parte que começa do zero. E essa experiência de manter o amor vivo para realizar um trabalho e, com aquelas pessoas durante um período partir, aprender a se despedir, aprender a inaugurar. A gente vive inaugurando elencos. Fica uma semana, um mês, um ano, fazendo uma novela… Aquelas pessoas que você nem conhecia e vai criando uma amizade muito profunda em muito pouco tempo. E daqui a pouquinho se despede. São times que fazem e desfazem o tempo inteiro, mas isso ensina muito sobre laço, sobre a presença do amor no laço dentro do presente. Isso eu trouxe muito para nossa casa, minha relação com o meu filho…Nós nunca deixamos as formalidades suplantarem o poder real do laço.

Elisa Lucinda e filho
Elisa faz questão de enfatizar a parceria com Juliano e o orgulho que sente do filho (Foto: Arquivo Pessoal)

Para você, família é tudo?

EL: Família é tudo pra mim no sentido lato, não no sentido estrito. Eu vejo a família muito importante, mas as famílias: as modalidades. Tem família só com mãe, tem família só com pai, tem família com dois pais, família, com vó, pai, mãe e filha… Tem muita variedade das estruturas familiares que dão conta da educação de uma criança. Na verdade, a grande família do mundo é tudo, esse é o bem mais precioso.


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